quinta-feira, setembro 17, 2009

Reflexões sobre o Ensino Fundamental e Médio no Brasil

Ensino Fundamental obrigatório e gratuito assegurado e Ensino Médio necessário e oferecido desde que o fundamental esteja totalmente atendido. Essas são as garantias quanto à extensão de atendimento desses níveis de educação, estabelecidos na LDB 9394/96, a Lei de Diretrizes e Bases que formatou o que a Constituição de 1988 estabeleceu para o ensino nacional. Um atendimento que precisa crescer cada vez mais, e redefinir o acesso ao Ensino Médio não mais como necessário, mas como obrigatório, uma vez que se sabe que, para sobreviver na sociedade competitiva atual, o Ensino Fundamental é muito pouco. A educação brasileira, na verdade, ainda está carente, e muito, de acesso, permanência e qualidade em todos os níveis de ensino praticados no país.
Tão importante quanto a garantia legal da oferta é a qualidade e os objetivos do processo educacional no país. Mas, aprender para quê? O artigo 32 estabelece como finalidade a aquisição de conhecimentos e habilidades, garantindo a formação de atitudes e valores no indivíduo. Ou seja, o Ensino Fundamental, hoje com a duração mínima de nove anos, tem como objetivo geral a formação básica do cidadão. O mesmo artigo prevê o domínio pleno da leitura, escrita e cálculo, a compreensão do ambiente natural, social e político, o conhecimento da tecnologia, das artes e dos valores fundamentais à sociedade. E ainda prevê que todo esse processo dependerá do fortalecimento dos laços familiares, da solidariedade e da tolerância entre os homens. Ou seja, ao contrário do que se vê atualmente, com as críticas voltadas fundamentalmente à escola e aos professores, a legislação prevê a parceria entre a instituição de ensino, a família a sociedade, distribuindo responsabilidades.o fracasso escolar, a forma como se deu a “leitura” e implantação em diversas partes do país gerou uma prática de aprovação automática, que gerou a baixa
É claro que muitos pontos da legislação, nobres em seu conceito, carecem de aplicação prática de qualidade. Um dos artigos mais questionados atualmente é a possibilidade da chamada “progressão continuada”. Apesar da intenção ser a busca da permanência do aluno para superar qualidade de ensino, em nome da popularização do acesso à educação. Ou seja, é positiva a concepção da LDB de que o Ensino, em especial o Fundamental, deve ser um processo contínuo, mas ainda é preciso uma reorganização total do sistema e do aspecto metodológico, para que as boas intenções da Lei se traduzam em qualidade educacional.
Outra questão polêmica, em especial nos últimos anos, é o ingresso da criança de 6 anos no Ensino Fundamental. Embora as escolas estejam, aos poucos, adequando-se às mudanças, o que se observa até agora é que simplesmente boa vontade de professores e coordenadores não basta. As escolas de Ensino Fundamentais não estão preparadas nem equipadas para receber esses alunos. E isso passa tanto pela estrutura física, como adaptação de banheiros e escadas ou pintura nova que atraia os pequenos, quanto pela compra de materiais pedagógicos, livros e brinquedos e pelo preparo de todos os funcionários da escola, e não apenas os professores. E apesar do próprio MEC alertar para a necessidade do primeiro ano não se "limitar" à alfabetização, na prática, por mais criatividade que se tenha, faltam os recursos físicos citados anteriormente. Além disso, é urgente a adoção de outras medidas como a reformulação da proposta e do projeto pedagógico e até a formação continuada de todos os envolvidos no ambiente escolar.
Já no Ensino médio, uma das principais preocupações é ser “direito público subjetivo”, já que a Lei 9394/96 prevê sua gratuidade e obrigatoriedade com extensão progressiva, o que o torna muito menos “universal” que o Ensino Fundamental. Quanto às finalidades, a legislação estabelece a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, a preparação básica para o trabalho e a cidadania, o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico, e a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos relacionando teoria e prática no ensino de cada disciplina. A crítica que se faz a essas finalidades é o embasamento em conceitos imprecisos e polêmicos, que geram avaliações subjetivas e tornam o ensino elitizado e individualistas. Eu acrescentaria, ainda, a necessidade, sim, de um caráter mais técnico, formando o adolescente também para o mercado de trabalho. Principalmente porque, com a baixa qualidade do ensino público atual, o ingresso na Universidade pública é extremamente difícil para o aluno que não estudou nas escolas particulares. Assim, os jovens oriundos das camadas populares terminam o ensino médio com perspectivas muito limitadas, uma que vivem a contradição entre a necessidade de trabalhar para pagar um universidade particular e a dificuldade de entrar no mercado de trabalho já que não possuem especialização em coisa alguma. Uma sugestão seria a inclusão de um ano profissionalizante para aqueles que não conseguirem ingressar na Universidade pública ao final dos três anos do Ensino Médio. Assim, a formação geral não seria prejudicada e o Estado garantiria a possibilidade de profissionalização, inclusive para aqueles que precisam do trabalho para prosseguir os estudos.
Para isso seria necessário, inclusive, novas rumos para a formação continuada dos professores, que precisariam ser preparados para ministrar, também, disciplinas profissionalizantes específicas. Assim, a formação continuada que tanto se prega para os professores das séries iniciais, em especial o novo primeiro ano para crianças de seis anos, seria também fundamental para os professores do Ensino Médio. Uma das grandes dificuldades nesse processo é que os professores, além de vontade, incentivo e motivação, tenham tempo para o próprio aperfeiçoamento profissional. Trabalhando em duas ou até três escolas para garantir o sustento da família, é muito difícil conseguir que o professor abra mão de parte da renda para estudar. Ou seja, a formação continuada passa por muito mais obstáculos que a oferta e o interesse. Passa pela valorização profissional, através de salários que permitam ao professor o tempo necessário para que se dedique à pesquisa e à própria formação.
Portanto, a visão educacional atual no país traz inúmeros avanços em relação a leis anteriores. E um dos principais é a concepção ampla do processo, visando a formação de indivíduos conscientes de sua inserção no meio social, através da participação crítica e cidadã. Mas muitas medidas práticas são necessárias para sua aplicação na sociedade. Não bastam boas intenções. Não basta jogar a culpa nos professores, nos alunos, na família ou na escola. Não basta jogar a culpa no governo. Todos têm sua parcela de culpa. E somente quando cada um cumprir o seu papel no processo de forma séria será possível de fato avançar na universalização e na qualidade da educação do país, como sonha a legislação que hoje a regulamenta.